quarta-feira, 30 de abril de 2014

E assim caminha a humanidade..


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Sempre me disseram que eu sou feita de uma matéria especial, liga forte, inquebrantável.
(Estou parecendo a  porta do poema de Vinícius de Moraes:
Sou feita de madeira, madeira matéria morta...)
Nunca entendi direito o real motivo para me colocarem nesse lugar.
Ou eu mesma me coloquei quando permiti que assim o fizessem.
Até que um belo dia a fibra, liga ou sei lá o que, rompeu, quebrou.
Quebrou enlouqueci, louqueci, pirei, sou psicótica e agora?
Agora o Outro me fala, o Outro me mobiliza, o Outro me vigia.
O Outro nada significa, a não ser a dor, o padecimento dessa voz e desse olhar.
O gozo da dor! Depois tento explicar isso, se é que tem explicação. Tô ficando neurótica mesmo! Acho que foi Lacan quem falou que a neurose é um tipo especial de psicose. Leiam Joyce, se puderem. Ali vocês vão encontrar um tipo sublime de psicótico. Eu adoro! Justamente, porque ele não faz esses questionamentos tacanhos: O que isso quer dizer? Porque aconteceu comigo? O que isso significa? Os neologismos são fantásticos. Isso é outra história ou será a mesma?
Delírio e realidade.O mundo é louco. Tão louco que se veste de normalidade.
Acho engraçado, hoje algumas pessoas me olham achando que para ser louco preciso estar enquadrada numa série de requisitos ( genéticos, sociais...) perguntam logo: tem algum caso na família? Acho uma graça, a normalidade é tão patética que me faz rir.
Observo pessoas, além de escutar vozes ( ah! hoje não escuto mais, elas estão sob controle medicamentoso, que pena!!!) e o que é pior acho que estou ficando neurótica - existe algo pior, sofrimento maior? Nem sei se é possível um psicótico virar neurótico.
O que sei é que vejo pessoas fazendo todo tipo de coisas em nome do bem-estar e da saúde, da felicidade.
Vejo que se faz dieta para emagrecer, para engordar, para "criar"  músculos.
Vejo que há uma busca desenfreada pela beleza a qualquer custo.
Vejo que cuida-se estritamente da saúde física ( hábitos e cuidados de higiene exacerbados, alimentação equilibradíssima) .Tudo em nome do equilíbrio.
Não deixando de lado o eterno encontro com a cara metade, existe um investimento enorme.
Tudo isso é normal. Siga o slogan: Felicidade para todos!
O que observo também que a depressão tem aumentado vertiginosamente, que  a síndrome do pânico é que deixou de ser raridade.
Que os consultórios dos psiquiatras estão lotados, todos querem um remedinho para curar seus pequenos defeitos ( sou desatento, sou depressivo, sou euforico, tenho insônia, sou sonolento demais, sou hiperativo...)
Não quero falar agora na busca incansável das bases fisiológicas.
Não tenho nada contra o avanço da ciência. Tenho observado que o cérebro está sendo fatiado, recortado e vendido a granel por pessoas que se dizem estudiosas ( será que estão delirando? Será que pensam que tudo é realidade? Não sei o que pensam e nem desejo saber? Uma coisa eu sei não vou enlouquecer da mesma forma que elas, elas estão muito ensimesmadas, é o pior tipo de "loucura" , a angustia consigo mesmas, com resultados, com o ego, a busca é frenética, a busca pelo significante.
Não caro leitor, não desejo isso pra mim.E o cérebro, coitado, ainda é um ilustre desconhecido. Porque não explicar tudo via conexões neuronais, sinapses?
Sem falar das "Neuro" hoje tem neuro pra tudo ( neuropsicologia, neuropedagogia , neuropsicopedagogia..haja neuro , haja neuras, desculpem-me o trocadilho, não resisti. Enfatizo que não tenho nada contra o avanço da ciência, mas é muito marketing, muitos cursos vendidos, muitos pesquisadores, todo mundo é neuro alguma coisa. Todos precisam ganhar o pão nosso de cada dia!
Percebo que só precisamos do psiquiatra para medicar os psicofármacos. Eu tive a sorte da minha psiquiatra ter um contato, uma escuta não duvidosa, sim humana. O contato psiquiatra e "louco" está desaparecendo, está sendo intermediado pela medicação. As doenças psíquicas estão ficando uniformizadas, homogêneas, os quadros normalmente, não evoluem por conta da medicação. Que bom, não?
Fica um dia sem a medicação pra ver o que acontece?
Não queira saber. Não pense que estar em surto é uma experiência ruim, degradante ou algo assim. Muito pelo contrário, estar em surto é apoderar-se, ter um poder singular, não posso explicar.
É mais ou menos assim, você pensa que é você quem fala. E eu tenho certeza que sou falada pelo Outro- que nada mais é do que esse algo que não existe.
Deixo você(s), são tantas(os) dentro de mim, com uma pergunta: Que verdade é essa que você se orgulha em ostentar?


A loucura nossa de cada dia










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